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26 novembro 2010

O Ensino Superior e cooperação internacional (1)

Do Professor Lourenço do Rosário
Docente Universitário e Reitor da
Universidade A Politécnica

NOS tempos que correm, habituámo-nos a designar de uma forma quase que indistinta os vários segmentos e natureza das várias categorias provedoras dos estudos superiores. Assim, designamos, praticamente sem qualquer crivo, as instituições de ensino superior como sendo escolas superiores ou institutos de educação superior, para além dos seus derivados e ou associados, como centros e faculdades.
A diluição em apreço não significa necessariamente que estas designações se estão a aproximar do grau zero e que a meta é que todas elas sejam a mesma coisa, isto é, os desígnios de uma Escola Superior serão os mesmos de um Instituto e que, em última análise, tanto faz e que tudo são as mesmas formas ou categorias de Universidade. Por isso, a fórmula Instituições de Ensino Superior parece niveladora, embora a mesma esteja prenhe de equívocos semânticos na sua relação entre a natureza, as características e os objectivos de cada e de todas elas em conjunto.
O homem, desde os primórdios do tempo, procurou sempre adquirir e dominar o conhecimento que lhe permitisse melhor sobreviver, na sua relação com a natureza e na compreensão da sua própria vida, quer na vertente singular, isto é, como indivíduo, quer como ser colectivo, visto a sua natureza ser gregária.
E o método de observação, hipóteses, experimentação para posterior adopção de teorias sufragadoras da cientificidade de algumas práticas empíricas tem a idade do próprio homem. É entre a física e a metafísica que devemos colocar o pulsar permanente do homem na história do estudo de como dominar a natureza e o entendimento sobre a vida. As demais áreas do conhecimento, tais como a Biologia, a Medicina, as diversas formulações Matemáticas, bem como os estudos de natureza social e humana e, por fim, a reflexão filosófica e teológica são progressos deste primeiro passo, cujo enfoque é na Física e na Metafísica.
A descoberta do fogo, por exemplo, pode ter sido casual e o seu uso por muito tempo perfeitamente empírico, mas o seu domínio e sua utilização no avanço das diversas tecnologias decorrentes do fogo, tais como a fundição, a pirotecnia e consequentes derivados, nomeadamente ao fabrico de armas, utensílios domésticos e agrícolas, bem como o seu papel na passagem do cru para o cozido, deveu-se à utilização do sistema metodológico que ainda hoje usamos nas ciências.
Na organização social, há, naturalmente, uma rigorosa distribuição de tarefas, por isso, existe aquele grupo que se ocupa do estudo dos fenómenos, de modo a produzir conhecimento que proporciona conforto físico e espiritual à sociedade no seu todo e a cada membro. Esse grupo ocupa-se igualmente da formação dos membros como um todo e garante a reprodução de alguns que darão continuidade à sua função. Desde que a criança nasce, ela é enquadrada num sistema iniciático de aprendizagem, acedendo ao conhecimento já produzido e dominado, quer a nível social, bem como ao nível familiar, nos fora público e privado. É esse conjunto de saberes que permite balizar as fronteiras de identidade de cada grupo e de identificação social e cultural de cada indivíduo ou família com o seu próprio grupo social. Por isso, devemos também escalonar o sistema de acesso ao conhecimento, conforme a idade e o processo de aprendizagem. E aqueles que conseguem ter acesso aos escalões do aprendizado com grau de dificuldade maior, ocuparão naturalmente posições mais destacadas na hierarquia social, nas várias vertentes de ocupação que a própria sociedade proporciona. Assim, desde sempre, o escalonamento do processo de aprendizagem e de acesso ao conhecimento tem em consideração um nível superior dos estudos na escola organizada para a vida, pública e privada, como por exemplo, nas lides pela produção de alimentos, na caça, contra as intempéries da natureza, na construção dos abrigos, na defesa contra animais ferozes ou contra o inimigo humano, na busca do entendimento sobre a própria vida perante a inexorável fatalidade da morte, na definição de obrigações e interdições que regulem as relações sociais e metafísicas, na busca da cura física e espiritual das maleitas e demais capítulos do conhecimento. Esta escola da vida foi sempre estruturada para responder ao estágio das necessidades de cada grupo social e, ao mesmo tempo, serviu de alavanca para a busca de mais conhecimento que permitisse o avanço dos instrumentos teóricos e tecnológicos facilitadores de cada vez maior conforto material e espiritual ao Homem.
Por isso, o conceito de estudos superiores não pode ser padronizado e enquadrado a partir de um determinado momento histórico de qualquer civilização que seja. Quer isto dizer que todas as comunidades que povoam a terra, desde o momento em que se constituíram e começaram a organizar-se para dominar o conhecimento para o seu próprio benefício, tiveram que escalonar o acesso a este conhecimento, de modo que o seu domínio fosse adquirido em conformidade com a idade e capacidade dos seus membros. Por isso mesmo, nem todos chegavam aos patamares mais altos e, por isso mesmo também, existe o princípio de especialização como consagração da necessidade de distribuição de tarefas. Platão, na sua obra “República”, reflectindo sobre a Cidade Ideal, não faz mais do que consagrar o primado da filosofia sobre as outras formas de conhecimento na liderança das sociedades, considerando ele que filósofo é aquele que atingiu o patamar mais alto da sabedoria, e por isso mesmo ele estaria mais apto para dirigir os destinos da cidade.

Publicado no Jornal noticias do dia 24 de Novembro de 2010

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